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26.2.10

Mais sobre Marcelo Dourado

em resposta ao que foi publicado no blog Bobagento
1. Dourado x BBB x Homofobia
2. Quem é preconceituoso?



Tenho lido por aí (inclusive, aqui no meu próprio blog) insinuações de que estamos neuróticos por taxarmos Dourado de homofóbico. O argumento principal é o de que, apesar das suas atitudes, como perder o apetite quando o assunto é “festa gay”, ou se isolar quando Serginho e Dicésar se acabam na pista, Dourado ainda seria capaz de conviver com homossexuais. Não gostar é uma coisa, desrespeitar é outra. Na casa, Dourado se diz vítima de “heterofobia”, e muitos de seus torcedores concordam.

Bom, com toda a certeza não sou a melhor pessoa para se manifestar quanto a isso, simplesmente porque acho BBB um programa desinteressante e não assisti a nem dois episódios inteiros. Mas já vi o suficiente para ficar bastante incomodado. Além disso, não é a pessoa do Dourado que ameaça, sozinho, toda uma comunidade GLBTT, mas sim o que ele significa e as atitudes de seus simpatizantes.

E as atitudes dos pró-Dourado que eu vi foram bem típicas: O twitter em peso desclassificando a concorrente Angélica por ter “bigode”, tentativas de fraude na votação entre Dourado e Angélica, boatos de ataques violentos contra travestis pelo “Esquadrão Dourado”, fora as agressões verbais por todos os lados. É claro que isso não significa que todos os simpatizantes dele sejam baixos, mas é impossível ignorar a quantidade de seguidores que o cara conseguiu simplesmente por ser “a bandeira hetero” dentro da casa.

Em primeiro lugar, queria dizer que a palavra “heterofobia” é, pra mim, uma afronta. Nas palavras do próprio Raphael Mendes, do blog Bobagento, ao qual estou respondendo,

“Que eu saiba, homofobia é dizer que homoafetividade é uma aberração, como faz a igreja. Homofobia é não admitir os direitos dos homossexuais de se casarem, de adotarem uma criança, etc. Homofobia é dizer que ser gay não é normal e acreditarem que é uma doença que tem cura. Isso é homofobia”.

Agora, vamos pensar em quantos homossexuais conhecemos que se referem à heterossexualidade como uma aberração, quantos homossexuais fazem militância contra o casamento heterossexual, bem como contra seus direitos civis e quantos defendem que heterossexualidade seja uma doença. Eu, particularmente, nunca ouvi falar de algum movimento como esse e, mesmo que exista, não é de longe tão influente e devastador como a representatividade das religiões organizadas em relação à homossexualidade. Heterossexuais não são alvos de crítica por sua sexualidade, não são agredidos física ou verbalmente, não se submetem a se fingir homossexuais para manter seus empregos, não têm opções escassas de lazer onde possam ser eles mesmos, ... Em nada a situação de um heterossexual se compara a situação de um homossexual na nossa sociedade. Como é possível alguém ter a cara-de-pau de se dizer vítima de heterofobia?! Isso, meus amigos, é que é se fazer de vítima sem motivos.

Contudo, ser homofóbico, na minha opinião, é mais do que isso que o blog Bobagento define. Para mim, ser homofóbico é permitir que esse quadro desumano de desigualdade e violência se mantenha. Nós, homossexuais, também somos humanos e não precisamos apenas de leis novas. Precisamos é de um lugar na sociedade. Precisamos ser respeitados, precisamos ter amigos, precisamos amar, precisamos ser admirados naquilo que somos bons, precisamos ter condições mínimas de humanidade, precisamos de estrutura psicológica, enfim, precisamos viver. Não é de leis novas que precisamos, precisamos é de uma sociedade mais justa, precisamos conhecer pessoas como nós, precisamos de líderes e ídolos. Precisamos de humanidade. O comportamento de Dourado, por mais diplomático que seja, ainda nos nega isso. Ainda nos mantém em segundo plano dentro de uma visão social, ainda violenta nossas necessidades mais básicas como seres humanos.

Eu sei que minha visão pode soar muito passional, mas é muito cômodo para um heterossexual se recusar a enxergar isso. Tem gente por aí que acha que aprovar uma lei à favor do casamento gay é suficiente para resolver o problema da homofobia, e isso não é verdade. Precisamos muito mais do que isso, porque somos vítimas dos mais diversos tipos de violência. E aqui uso o "nós" pra evidenciar que me sinto inserido dentro de uma minoria social, e não para me fazer de vítima como o covarde do Dourado. Tenho plena noção de que os constrangimentos que passei por conta da minha orientação não são nada comparados com histórias que eu ouvi, de conhecidos ou não. Por isso consigo, de certa forma mas não sem dificuldades, me manter num padrão de aparentemente normalidade, o que é um baita privilégio.

Além disso, o que incomoda em Marcelo Dourado é o seu cinismo. É ele falar que tem nojo de homossexuais, e depois pedir desculpas. É ele criar uma argumentação, por mais válida que seja, para tatuar uma suástica no braço. É ele falar desnecessariamente que heterossexuais não contraem HIV. Não é apenas uma questão de ele estar errado. É questão de nos perguntarmos: qual era a intenção dele ao falar isso? Não foi um comentário inocente e ignorante, tem malícia por trás dessa defesa. Tem homofobia sim, porque nada me convence que não foi intencional.

O comportamento dele cria toda uma mentalidade de que um hetero, para não ser homofóbico, deve tratar os gays da forma mais distante possível, interagindo apenas quando for estritamente necessário. Não é esse o mundo que nós gays desejamos, e isso nos agride sim. Além disso, esse tipo de argumentação cínica é tudo o que o Brasil não precisa. Para mim, soa exatamente da mesma forma que o ex-governador Arruda dizendo que o dinheiro público era para comprar panetone. É argumentar diplomaticamente em favor de absurdos.

E é verdade também que ele tem essa nova estratégia, a de se aproximar do Serginho para mostrar que não tem nada contra homossexuais. Nada me soa mais dissimulado. Simplesmente não é convincente. Sem dúvida é uma estratégia fajuta para que a comunidade GLS vote menos nele (e para dar força ao argumento "heterofóbico").

Dourado não é apenas um exemplo de homofobia disfarçada, mas também, como eu já disse, de machismo, violência e agressividade. Não é normal uma nação simpatizar com um cara que, mesmo que seja só em palavras, diz ser capaz de “bater numa mulher até quebrar seus dedos”, “chutar um cachorro para aliviar a tensão” e “vomitar em cima do Caetano Veloso”. Isso não é carisma, desculpa, e não é se não maldoso. Para mim, falar como Marcelo Dourado é falar como um criminoso.

O blog Bobagento nos critica, ainda, pelos tweets anti-Dourado, dizendo que estes são, em geral, preconceituosos, agressivos e sem argumentos. Como comentei no citado blog, o twitter é um microblog com posts não maiores que 140 caracteres. Como alguém pode esperar encontrar nossa argumentação de forma concisa e coerente no Twitter? Por outro lado, a argumentação dos pró-Dourado foi “Angélica Bigoduda”. Argumento forte esse, não? O twitteiro @thi_peres notou, ainda, muito concisamente, que Cláudia, Elenita e Anamara também têm buço. Só Angélica leva a fama e não é homofobia!

É verdade, por outro lado, que o povo votou e Jean Wyllys levou o prêmio numa versão passada do programa. Mas a questão da homossexualidade não estava, nem de longe, tão aparente como nessa versão do BBB. Votar em Jean Wyllys não significava apoiar a causa homossexual na época. Não como significaria nesta 10ª versão. O que os defensores de Dourado não percebem é que existem diferentes graus de preconceito e, tudo bem, a sociedade brasileira é hoje muito mais tolerante do que era no passado; mas a questão é: será suficiente? A nossa luta, hoje, é contra essa homofobia dissimulada que Marcelo Dourado não é se não um símbolo.

Ganhando o BBB, Dourado não será o primeiro homofóbico a fazer fortuna nesse país. Disso não temos dúvida. Mas simplesmente não podemos mais tolerar lidar com a homofobia disfarçada. Dizer que Dourado não é homofóbico é equivalente a dizer que mulheres, índios e pretos não são vítimas de preconceito nesse país. É certo que a luta já começou, mas não está nem de perto determinada, em todos os casos.

Um comentário:

Ayanne Christine Vieira disse...

Concordo plenamente! A influência que ele exerce é muito grande e deve ser vista com cuidado! E os preconceitos dele não é só com a comunidade gay... um sujeito que tem a suástica tatuado é alguém pra se ver com cautela sim!!!!!